A propósito do democrata Álvaro Cunhal

Por momentos fiquei a achar que o "camarada Álvaro" era mesmo democrata. A comunicação social perdeu tanto tempo a focar as qualidades do senhor, a sua vida pessoal, a sua faceta de escritor, pintor e intelectual, tendo, em contrapartida, tão pouco tempo a analisar o seu perfil político que fiquei seriamente baralhado. 

Felizmente a crónica de Vasco Pulido Valente no Público da passada Sexta-feira avivou-me um pouco a memória acerca das reais façanhas do senhor que nos queria "libertar" para nos "enterrar" numa outra ditadura, diga-se, muito mais radical. Pulido Valente refere de forma assertiva o seguinte:

"Como hoje se lembram de Cunhal os militantes do PCP, os "companheiros de caminho" e umas largas dúzias de patetas. O indivíduo que planeava transformar Portugal numa espécie de Bulgária do ocidente, o promotor do PREC, o responsável pelas "nacionalizações" e pela ocupação dos "latifúndios", o desorganizador da economia, o inimigo da "Europa", esse parece que desapareceu". Só resta, com muito sentimentalismo, como ele gostaria, a máscara de soberano, perante a qual ainda uma pequena parte deste país se acha obrigada a genuflectir. A consciência histórica dos portugueses é um óptimo reflexo da inconsciência que os trouxe à miséria e ao desespero"

Ah, afinal o Cunhal não era assim tão imaculado e espectacular. Gostava que viessem a terreiro os historiadores que acusam, por exemplo, Rui Ramos de instrumentalizar a história, criticar todos aqueles que têm vindo a instrumentalizar a história do PCP e do próprio Cunhal. Esses Reis da imparcialidade que tanto criticaram o volume da "História de Portugal" mas que não se preocupam tanto em desmistificar o "Deus" Álvaro Cunhal, esse "cisne branco", essa pomba da paz que usa a foice e o martelo para trabalhar e nunca, jamais, para ceifar e martelar as cabeças que não pensam como ele. 

Já que falamos em ceifar todos os que não pensam como o PCP...

O PCP não pode ceifar as cabeças daqueles que são contrários às determinações do partido, o que, creio, deve ser uma pena imensa para os militantes mais acérrimos. Já que não  podem eliminar os adversários fisicamente fazem-no de forma intelectual. O Congresso do Centenário de Álvaro Cunhal é um fiel exemplo. Mais uma vez vemos o sentimento democrata do partido! Só aqueles que escreveram textos bajulatórios ao Álvaro transpirando Marxismo e comunismo foram autorizados a participar. 

PCP sempre na senda da pluralidade de opiniões desde que...sejam abonatórias ao pensamento do partido. É esta visão paupérrima da realidade num grau míope de quase cegueira que faz do partido o rosto do Álvaro. Conservadores que chegue, completamente adversos à mudança e, claro está, fanáticos numa política que a história já provou só trazer sofrimento, angústia e...Holodomor's, Katyn's, genocídios vários, clima de medo, controlo social, etc. A lista é longa...

Apesar de tudo, podemos estar descansados...o futuro do comunismo em Portugal é...fraquinho...

"O que me atrai mais no Álvaro?! (risos) sei lá...é que eu não, lá tá...é que nós não temos...nunca fomos...nunca fomos em relação a nada, e acho que é uma...é uma coisa...uma coisa...uma coisa minha, mas também acho que é uma coisa de alguns camaradas, se calhar a maior parte, que é que não somos...não somos muito da...da figura (oh, o Kim e o Estaline que o digam) não centramos muito a questão da figura."

Esta foi a resposta com contornos de surrealismo dada à questão: "O que mais te atrai no Álvaro?"

No fundo o que o jovem entrevistado quis dizer é que a vida pessoal do líder não é relevante para o mundo comunista mas...não é que o congresso do centenário dedicou uma parte da sessão a ISTO?!?!?!?!? Em que ficamos então? Pois, só quando dá jeito é que a vida pessoal do Cunhal deve ser analisada...compreendo! 

Após o primeiro minuto do vídeo, uma outra jovem diz: "Álvaro Cunhal foi uma pessoa que dedicou a sua vida por uma causa." Isso ou então: "Álvaro Cunhal foi uma pessoa que dedicou a sua vida a tentar chegar ao poder para ser o chefe incontestável de uma nação". Não vos parece mais plausível???

Continuando a dissecar o vídeo...uma outra jovem afirma: "A mim não me incomoda o ar austero, o repto do Álvaro Cunhal, acho que pelo contrário...essa questão é até fascinante..."

Fiz uma pesquisa por indivíduos com ar austero. Adivinhem lá quem encontrei...

O Adolfo...

...o tio Zé...

...o camarada Kim...

...e finalmente, o Rafa!

Como podem constatar...tudo malta porreira! 

Um dos jovens supracitado diz que: "A comunicação social tenta transmitir a ideia que o PCP é o Álvaro Cunhal" mas, segundo o mesmo "é ao contrário...o Álvaro Cunhal é que é o PCP". Esperem lá...isto não é a mesma coisa???

Bem, eu podia continuar a analisar o vídeo mas, com toda a sinceridade, são coisas que me fazem mal à saúde mental. Tenho de sair, vou ali ao Seixal contornar a Quinta da Atalaia em joelhos à memória do Deus Álvaro Cunhal.

Bom dia. 

Xesko retrata "o Álvaro"